Saia eu para uma boa pedalada
rumo ao cedro, quando, ainda na saída de casa, me deparei com uma cena, a
princípio, normal: uma moça com uma senhora conversando. Não ouvi o que falavam
e até não tinha porque dar importância. A senhora era um gari da prefeitura,
fazendo o seu trabalho honrado e que muito admiro, principalmente pelas
condições que tal trabalho se dá. Sempre expostos ao sol e ao relento,
normalmente invisíveis, mais normalmente ainda lembrados, quando tem seus
salários, miseráveis, atrasado por total irresponsabilidade do poder público.
Dito isto, prossegui minha ida
até meu destino: Partiu cedro! Entre um buraco e outro; entre carros, sol no
rosto, vento forte e afins, fui indo no meu caminho. Gente bem vestida fazendo
seu “cooper”, tênis dos melhores, alguns bikers também, outras pessoas nos
bares, curtindo a vida adoidado como se o tempo não existisse.
Cheguei no cedro, lugar onde não
podemos mais subir com a bike, nem que seja empurrando, tomei um folego, bebi
uma água, vi gente chegando, gente tirando foto. Tirei aquela selfie top. Puxei
conversa com uma desconhecida, comentando justamente a situação de não podermos
subir com a bike... enfim, subi na bike e voltei.
O interessante de todo este
relato, foi visto na volta. Eis que quem me reaparece? A senhora, gari, e a
mesma moça. Desta vez, claro, tive que tirar conclusões: provavelmente eram mãe
e filha, provavelmente estavam conversando sobre um assunto importante, ou
então, era apenas a filha esperando a mãe terminar o serviço e ir pra casa, juntas.
De qualquer forma minha mente foi além daquilo visto naquele momento...
Vi, que a prefeitura passou a
semana, não sei se em tom de homenagem ou coisa do tipo, pois procuro não
opinar sobre coisas que, primeiramente, acho desnecessárias, e segundo, discutir
certos assuntos, onde quem não é cegamente a favor da exposição da sexualidade
alheia, ou do trato incondicional de que existe quase que um extermínio de uma
determinada raça, é ou racista ou racista.
Como disse, vivenciamos ainda uma
pandemia. Algo concreto, algo que levou a morte milhares de pessoas e de uma
forma ou de outra, mudou a vida de todos nós, sejamos heteros ou não. Nessa esteira,
os pobres certamente ficaram mais pobres, mas não acredito que os “intolerantes”
tenham ficado mais intolerantes.
Costumo não ver pessoas e cores. Sou
do tempo em que “negão” era nome e sobrenome do meu pai, sem mi-mi-mi e essas
coisas de hoje em dia. Fora isso, será que com essa compartimentação social,
nos tornamos mais “tolerantes”? O mundo é um lugar melhor só porque agora temos
o arco-íris como bandeira nacional?
Não entendo, não compreendo e não
vejo como isso seja importante. Para mim é muito mais uma questão política,
para angariar votos e eleitores, do que um real comportamento de se importar
com determinada causa. Nem vou entrar aqui na velha e batida questão de “dividir
e conquistar” ...
Nessa mesma questão de
compartimentar determinado seguimentos sociais, poderíamos passar pelos
defensores dos cães, gatos, cobras e todo tipo de bicho que podemos trancar em
casa e chamar de “meu bebê, filhinho”. Mais uma vez não critico que acha que
temos problemas de menos e tem seu tempo de dar mais importância a bichos do
que a pessoas.
Claro que sai do cerne do texto,
mas contextualizar tudo que acontece ultimamente, além de cansativo, é
depreciativo, no sentido de realmente valorizar os problema reais.
A pobreza é o único problema real
que existe. O resto é invenção da cabeça dos homens, normalmente ricos e
poderosos, que tem inteligência o bastante para gerenciar tipos sociais e ver
neles apenas uma boa oportunidade para angariar votos.
Sendo a pobreza o grande problema
real, qual a atual programação do poder público para ir de encontro a pobreza? Qual
a semana do GARI? É só um café da manhã e pronto? É só uma foto de começo de
gestão e pronto? Infelizmente é só isso.
Aquela garota que andava pelas
ruas com a mãe, jamais poderá desfrutar das beneficies de uma sociedade doentia
e avarenta como a nossa; ou ela “rala” muito, quebra milhares de barreiras, ou
será apenas mais uma na multidão. Não teremos a semana dos filhos dos garis,
nem muito menos teremos bolsas de estudos bancadas para crianças de baixa renda.
O plano é não ter plano. O plano
é apenas fazer de conta que o problema é de ordem sensorial, onde cores, sejam
a do arco—íris ou negros e brancos, são estigmas a serem combatidos.
Eu vejo o céu azul, o sol amarelo,
as nuvens brancas ou cinzas, mas nunca vi um gari com bota nova, roupa limpa e
os filhos com grandes oportunidades.
Desde já deixou claro que este
texto não é uma crítica a quem quer que seja, mas apenas uma reflexão de alguém
que acha que todos somos iguais em diferentes formas e sentidos. Respeito por
demais o ser humano. Tento ser o meu melhor, fazer o melhor e principalmente,
não sendo um problema a mais para um mundo já tão problemático.
Vamos em frente, pois lutar é a
única opção. Parabéns aos garis, parabéns aos brasileiros que trabalham de
forma humilde, que por vezes nos são invisíveis, mas que fazem nosso mundo
funcionar. Este trabalhador, humilde, é o verdadeiro merecedor de nossa atenção
e dedicação.
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