Acostumamo-nos a ouvir vozes e delas extrairmos aquilo
que nós próprios temos como verdade. Ao escutar dos outros, trazemos para si
experiências, por vezes, passadas de geração em geração. Assim sendo, muitos de
nós, em pouco, nos diferimos do papagaio, que repete aquilo que escuta e
reproduz do seu jeito.
Claro que o pobre pássaro jamais entenderá o que está
dizendo, mas de alguma forma, sem empatia, ele tenta agradar aqueles que lhe dão
alimento.
Conosco não é tão diferente assim. Ficamos bem com quem
nos faz e traz o bem, e de mal com o oposto citado. Não somos melhores que os
animais que domesticamos, apenas temos o entendimento que deve ser assim.
O animal, inato, inóspito de ideias, reflete tanto quanto
o ser humano o ambiente no qual habita, transformando, por vezes, as prisões visíveis,
em algo pelo qual viver. E aqui estamos diante do grande dilema: quanto somos
livres?
A resposta, tal qual a pergunta, carece de sentido quando
nos colocamos diante dos outros. Minha liberdade é ser livre de quê? A do
animal, ao ser tirado da natureza, tem no seu “dono” o espelho no qual teria na
fome e na necessidade de buscar alimento na própria natureza. Torna-se assim, o
bicho, escravo de uma necessidade intrínseca a todos os seres viventes que é a sobrevivência.
Todos somos sobreviventes de algo. A nós, humanos, cabe
primeiro, ser o embrião escolhido. Sobreviver a gestação e maturar durante infância
e puberdade, torcendo, se é que exista alguém que o faça por nós, para que “tudo
dê certo” e sejamos, ao final da vida, algo além de uma vaga lembrança no pós
morte.
Ao dedicar a vida em favor de algo, estamos sempre
perdidos e presos a essa dualidade, entre ser livres e viver em busca da sobrevivência,
ou sermos escravos de uma existência sem liberdade.
O homem não é livre ao nascer. Jamais será em vida. Apenas
a morte o liberta do divino humano e do imortal dever de viver sob o julgo
alheio. Ninguém esta e nem mesmo pode, estar distante de vagar entre os anos de
vida, contra tudo ou contra todos. Somos tão pobres que pensamos ser melhores
do que os menos afortunados.
A existência humana se perfaz na cobiça por mais. Ao contrário
do bicho que repete várias palavras, em busca de algo que ele não sabe e nem
tem noção do que é, nós, humanos, vindos do ventre, jogados para a “externidade”
do mundo e para nele sermos servos de contratos e preconcepções, não somos
dotados da escolha.
Viver é uma prisão existencial criada pela escolha, por
vezes, malfadada ao acaso. Somos humanos por acidente da natureza. Achar que
exista algo além de nós, no espaço ou no “secreto e divino espírito santo”, é
como se o papagaio começasse a falar sem nunca ter ouvido uma voz.
Ou você acredita que existam papagaios selvagens que
falam “loirinho”?
Somos ensinados a obedecer a aquilo que desconhecemos.
Pai, mãe, família, direito, certo, moral, deus e todos
mais que possamos encontrar pelo caminho, todos são limitações a nossa
liberdade. Ninguém nasce livre, do ventre somos libertos e durante a vida, em
algum momento, a existência se findará sem um aviso.
O homem é escravo do silêncio que ele próprio nunca
aprendeu a respeitar; somos um fato que não acontece se estamos sozinhos; somos
ato biológico de decisões além-mar de pessoas que chamaremos por nomes que eles
mesmo aprenderam a chamar.
O papagaio ou o homem, diferentes, mas enquanto vivos,
são apenas seres que repetem um silêncio nunca respeitado. Pobre de quem
procura sentido em si mesmo, não encontrará, pois tudo que tem, ou lhe foi dado
ou lhe foi ensinado a ter ou tomar.
A vida é isto: nada além de um silêncio não respeitado
pela natureza.